O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) decidiu trocar o líder do governo na Câmara e substituir o deputado Vitor Hugo (PSL-GO) por Ricardo Barros (PP-PR), em um novo aceno ao centrão.
Barros foi ministro da Saúde no governo de Michel Temer (MDB) e é do mesmo partido de Arthur Lira (PP-AL), que atua como líder informal do governo na Câmara.
Novo capítulo na aproximação de Bolsonaro com o centrão, a substituição já era especulada desde o fim de julho. O presidente quer dar mais espaço ao grupo político, do qual se aproximou nos últimos meses para ter apoio no Congresso.
Além do PP, o centrão reúne partidos como PL e Republicanos e ajuda a sustentar o governo em votações na Câmara, depois do racha do PSL, antigo partido do presidente da República.
O novo líder confirmou a substituição em uma rede social.
“Agradeço ao presidente Jair Bolsonaro pela confiança do convite para assumir a liderança do governo na Câmara dos Deputados com a responsabilidade de continuar o bom trabalho do líder Vitor Hugo, de quem certamente terei colaboração. Deus me ilumine nesta missão”, escreveu Barros.
O deputado Arthur Lira levou o peso do bloco para a negociação com o governo em um momento de fragilidade de Bolsonaro por causa da demora em reagir ao avanço da pandemia do coronavírus e do impacto do caso Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) que foi pivô das investigações sobre "rachadinha" na Assembleia Legislativa do Rio e que está em prisão domiciliar.
Ao apostar em Lira, o governo federal tentou, na avaliação de integrantes do Planalto, enfraquecer a liderança de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e, de quebra, criar um cenário favorável para ter um sucessor do presidente da Câmara mais favorável à agenda bolsonarista.
Há algumas semanas, Lira mostrava resistência com uma possível indicação de Barros para a liderança do governo na Casa. Para integrantes do centrão, a escolha de um deputado experiente na articulação do governo na Câmara poderia esvaziar o poder que Lira concentrava até então.
Após a confirmação de Barros, Vitor Hugo também foi às redes para agradecer a Bolsonaro.
"Agradeço imensamente ao presidente Jair Bolsonaro pela confiança em mim depositada durante esses quase 19 meses à frente da liderança do governo na Câmara. Muitos desafios superados e grande amadurecimento. Desejo toda sorte ao novo líder Ricardo Barros, que contará com meu total apoio."
Bolsonaro avalia recriar o Ministério da Segurança Pública e indicar Vitor Hugo para comandar a nova pasta. Para isso, o presidente quer que o Congresso vote o projeto que prevê a autonomia do Banco Central, o que retiraria o status de ministro do presidente do BC —o cargo seria destinado à nova pasta.
Com a troca na liderança, o presidente pretende também garantir votos para futuras votações de interesse do governo, como a reforma tributária, e atender a um pleito dos deputados do centrão, que têm feito pressão por uma troca na articulação política.
A avaliação é a de que, apesar de Vitor Hugo ter a confiança do presidente, ele enfrenta resistência no Legislativo e entra frequentemente em choque com o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, responsável pela articulação política do Planalto.
A ideia é que o comando da liderança do governo sirva também como uma espécie de "test-drive" para Barros, que pode até o fim do ano ser deslocado para um cargo na Esplanada dos Ministérios.
O nome do congressista é avaliado por Bolsonaro para assumir o Ministério da Saúde após a saída do atual ministro, o general Eduardo Pazuello. O militar já disse ao presidente que, após o arrefecimento da crise da Covid-19, deixará a pasta.
A expectativa é a de que ele permaneça no posto até outubro. Para seu lugar, Bolsonaro já disse que quer um perfil semelhante ao do general. Ou seja, o de um bom gestor que não seja necessariamente médico de formação.
O centrão, bloco recriado na Câmara a partir de 2015 sob o comando de Eduardo Cunha (MDB-RJ), hoje preso em decorrência da Lava Jato, era demonizado até pouco tempo atrás por Bolsonaro e aliados, sendo tratado como a pior coisa que há na política, nas palavras do próprio presidente.
Um dos principais conselheiros de Bolsonaro, o general Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), chegou a ensaiar uma cantoria pejorativa contra o grupo durante convenção do PSL, antes das eleições de 2018.
"Se gritar pega centrão, não fica um, meu irmão", cantou Heleno, em cena filmada e postada nas redes sociais, comparando os parlamentares da legenda a ladrões.
Até maio, o grupo era alvo de manifestantes pró-Bolsonaro que se reúnem em frente ao Palácio da Alvorada aos domingos.
Com o apoio do bloco, o presidente pode criar uma base mínima de sustentação no Congresso que evite o prosseguimento de um possível processo de impeachment.
Após os encontros com Bolsonaro este ano, líderes dos partidos, que contam com cerca de 200 dos 513 parlamentares, se colocaram publicamente contrários ao impeachment. Para que seja deflagrada a tramitação de um pedido de impedimento, é preciso autorização de Rodrigo Maia, hoje adversário de Bolsonaro, mas que tem resistido a dar o aval.
Para o grupo, o presidente já cedeu cargos como a direção-geral do Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas), a chefia do Ministério das Comunicações e a Diretoria de Ações Educacionais do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).
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